E-commerce é aposta de artesãs para ampliar renda
Projeto da UFMG originou novas estratégias de atuação da Imani Anna
21 de janeiro de 2022 às 0h28
As bonecas pretas produzidas artesanalmente por cinco mulheres de Vespasiano, Região Metropolitana de Belo Horizonte, significam renda e representatividade. Em meio à pandemia da Covid-19, as artesãs responsáveis pela Imani Anna, como é chamado o negócio, precisaram se adequar a um antigo chamado para fortalecer a presença dos produtos no mundo digital.
Contudo, antes mesmo dessa necessidade de se adequar aos fechamentos das feiras, onde as vendas estão concentradas, as empreendedoras perceberam que era necessário aprimorar a gestão do negócio.
Novos conhecimentos
“A princípio, a gente entendia que empreender é técnica e artesanato. Mas na prática, não é tão simples. E a gente percebia alguns gargalos”, conta Ana Paula Soares Medina, artesã que integra o Imani Anna.
Essa percepção foi o que estimulou o grupo a participar do edital de 2018 do Programa Colmeia, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), que tem o objetivo de promover conhecimento por meio de oficinas e rodas de conversas sobre empreendedorismo, gestão financeira e a utilização de ferramentas de marketing digital para produtores da economia popular solidária.
Com a participação nas oficinas do Colmeia, o grupo Imani Anna começou a pensar em pontos específicos e definir quem era o público das bonecas e dos bonecos de pano, a persona do empreendimento e todo o processo de gestão que faz a engrenagem funcionar, conforme conta a artesã Ana Paula Medina.
Mensalmente, em 2020, as artesãs produziram em média 15 bonecas por mês, de variados modelos, sendo que o preço de cada uma era em torno de R$ 84. No entanto, a produção em 2021 oscilou e a Imani Anna teve uma baixa no número de pedidos, dado que o grupo acredita representar a queda também no poder de compra da população.
O trabalho para a produção de cada artesanato leva, em média, cinco horas até a finalização. No entanto, as artesãs trabalham por processos. A cada dia, uma das etapas é cumprida: corte das roupas, do “corpo”, costura e demais passos. Os insumos utilizados são, em sua maioria, tecido de malha, tricoline, fibra de silicone, lã e tinta própria para tecido, e a produção considera, ainda, a utilização de retalhos.
A busca pela formação se tornou uma constante na vida das mulheres artesãs, que, além da venda do artesanato, têm diferentes fontes de renda. Recentemente, o grupo realizou cursos de fotografia para realçar a beleza e os detalhes trazidos nas peças produzidas e seguiram ativas nas redes sociais.
“A pandemia nos obrigou a andar por um caminho que a gente ainda não conhecia. Nós tivemos a sorte de conseguir o auxílio (emergencial) para todo o grupo e, ao mesmo tempo, buscamos mais conhecimento em marketing, redes sociais, para chegar ao nosso cliente”, afirma Ana Paula Medina.
A artesã lembra também que para itens de artesanato é importante que as pessoas tenham contato com o produto. Apesar disso, os resultados com o engajamento nas redes sociais logo foram sentidos. Hoje, o Imani Anna é mais conhecido e cresceu enquanto empreendimento, sendo que as vendas on-line é que estão garantindo a maior parte da renda resultante da comercialização das bonecas.
O impacto positivo da nova gestão do negócio, e que é fruto do incentivo do Colmeia, é que a complementação da renda das artesãs se torna mais expressiva. Contudo, um segundo segredo para a gestão dos negócios está em um ponto para lá de especial: entender o propósito daquilo que se faz.
“Por várias vezes nós pensamos em desistir de fazer as bonecas. A produção começou em 2007, com a passagem de muitas mulheres. E hoje somos cinco. E a cada dificuldade a gente repensava a existência do empreendimento. E durante esses anos a gente tentava identificar por que as pessoas gostavam tanto das bonecas pretas. Até que percebemos que é pela falta de representatividade. E se ver em um produto é muito importante, ter referência”, diz Ana Paula Medina, que acrescenta que o objetivo é trazer fortalecimento da cultura afro-brasileira enquanto missão.
O Programa Colmeia
Conforme explica a professora da Faculdade de Ciências Econômicas (Face) da UFMG, Sibelle Diniz, o Colmeia é um programa de extensão de longa duração criado em 2014 e que é composto por diversos projetos que buscam apoiar os produtores na comercialização de itens, prestando assessoria por meio de construções pensadas conjuntamente.
No período anterior ao início da pandemia da Covid-19, a própria Face recebia feiras de economia popular solidária com a exposição dos produtos dos empreendedores aprovados no edital para participação nos eventos e no Colmeia. Naquele momento, eram realizadas oito feiras de artesanato anualmente, com a apresentação de 10 a 12 produtores. Em média, a cada semestre 40 grupos de produtores faziam parte das oficinas do Programa.
“A feira era esse lugar de comercialização e onde eram feitas também as atividades formativas, com trocas entre os produtores e formação para nossos estudantes que aprendiam muito ali e construíam soluções para os selecionados”, explica a professora Sibelle Diniz.
Atualmente, o Colmeia realiza o trabalho de forma remota e realiza, principalmente, apoios à comercialização não presencial, com a monitoria de, em média, 50 grupos de produtores. Com a pandemia, o Programa estruturou conteúdos para que os produtores da economia popular solidária selecionados tivessem conhecimento sobre as vendas on-line e em redes sociais, além de reuniões virtuais para o compartilhamento de experiências dos próprios artesãos e artesãs.
“A gente sabe que para a maior parte dos produtores houve perdas, queda de rendimento. Por isso, a nossa ideia era que eles conseguissem recompor ao menos uma parte com o comércio digital. E a gente percebe dois grupos de produtores: um grupo que conseguiu se estruturar bem durante a pandemia, que já tinha facilidade com isso, e outro que tem mais dificuldade com a tecnologia e que só agora estão se recompondo com o retorno das feiras presenciais”, observa Sibelle Diniz.